domingo, 29 de agosto de 2010

A pão de Ló



Quando eu era criança sempre ouvia minha avó contando como fazia o seu pão de ló, achava o nome engraçado e sempre que ouvia alguém falar eu lembrava dos rocamboles que ela fazia, do sabor, da textura bem macia, quase derretia na boca. Eu sempre tive uma mente de gordinha e grande parte da culpa é da minha avó e das férias que eu passava na casa dela, certamente eu ia só pelos quitutes.

Também me lembro que depois de um certo tempo de férias eu pedia pra minha mãe:
- Mãe, faz rocambole?
- Ah! Não filha, eu não sei fazer pão de ló, é muito difícil, só sua avó sabe.
- Mas mãe, o rocambole é feito de bolo e não de pão.
- O nome da massa é pão de ló filha.
- E por que se chama pão se parece bolo?
- Não sei, vai brincar, vai.

Certa vez, depois de tanto eu "encher o saco", minha mãe foi pedir para uma vizinha quituteira lhe ajudar a fazer o pão de ló. Eu observei atentamente o preparo para ver o que de tão difícil tinha nessa receita que minha mãe não podia fazer pra mim. Parecia que não ia acabar nunca. A mulher mexia e mexia e mexia e nada de colocar na forma. Bastante tempo depois me chamaram pra contar que não ia ter rocambole porque a massa tava mais dura que a parede. Minha mãe e a vizinha pareciam furiosas, e eu perguntei:
- mas não era pra ser macio que nem bolo?

Fiquei sem o rocambole, na esperança de minha avó fazer nas férias pra mim.

Hoje, muitos anos depois, me bateu uma vontade de comer rocambole, mas o caseiro, que nem o da minha avó, com recheio de doce de leite e ameixas. HUMMMMMM

Mas aí bateu a dúvida, e o pão de ló?

- Mãe, vamos fazer rocambole?
- Mas é com pão de ló.
- Eu sei.
- Então faça.
- Mas eu não sei.
- Procura a receita na internet (pensei que ela ia dizer, liga pra sua avó, mas minha mãe é moderna, rs).

E lá fui eu, achei várias diferentes, escolhi a que tinha mais dicas e cuidados, porque afinal a feitura deveria exigir muita cautela.

Vi que a receita era portuguesa, e não poderia ser diferente com tanto ovo. Não tenho nenhum parentesco com lusitanos, mas minha vó é mais polaca que eu e se ela conseguia eu também podia.

Minha mãe acompanhou o processo com um semblante de desconfiança (xi, será que vai dar certo?).

Bom, depois dessa aventura eu descobri o real significado de "ser tratado a pão de ló". Oh. massinha difícil de fazer, mas ao mesmo tempo é divertida e uma delícia de preparar, mas já aviso que tem que estar com paciência.

Começa batendo as claras em neve e reservando. Bate as gemas com água quente e levanta uma espuma até a borda da bacia (nessa parte é que eu comecei a achar divertido). Coloca o açúcar e bate mais, a espuma vai encorpando. Peineira o trigo aos poucos sem parar de bater (fiz uma bagunça), dai vai batendo por 20 minutos sem parar (começa a ficar chato, por isso falei da paciência, principalmente se você não tem uma batedeira que gira a bacia sozinha, que nem eu).
Para de bater. Acrescenta o fermento e as claras em neve, e delicadamente, vai misturando, sempre de baixo pra cima. A massa é muito delicada, dá até medo de mexer e machucar. Coloca na forma untada e "enfarinhada".
Bate a forma pra tirar as bolhas, nessa hora minha mãe estava no telefone, por acaso falando com minha avó, e gritou:

- NÃO FAÇA ISSO!
- Calma, tem que bater pra tirar as bolhas, pra na hora de cortar não desmontar. Eu sei o que to fazendo, ou pelo menos acho que sei, risos.

Foi pro forno alto, depois baixo.
Assou.
Desenformamos.

A hora de cortar é o ponto crucial, é o que vai dizer se a massa ficou macia, ou se desandou tudo e os cachorros iam ter sobremesa.

Minha mãe, com a mesma cara desconfiada:
- Vai cortar?
- Não, corta você, sou muito descordenada pra isso.
- Dá a faca.

Dei. Silêncio. Cirurgicamente minha mãe cortou.

- E aí? Perguntei.
- É filha, você tem mão pra pão de ló.
- É, tenho duas.
- Palhaça. Rimos aliviadas.

Recheamos. Tem que enrolar com toalha por baixo.

Cortei um pedaço, ainda não tinha sentido a textura... hummmm ficou tão macio.

Realmente, minha vó tinha uma paciência de jó pra fazer tanto pão de ló para seu bando de netos. Mas, quando eu tiver os meus eu vou fazer com muito prazer e contar pra eles a histórinha do pão que parece bolo. Afinal, é pelas pessoas que amamos que aprendemos a fazer coisas difíceis, se não, em que teria graça?

(à um gajo).

Mudança de identidade...

Olá meus leitores (2)...
Mudei o o nome do meu blog, porque percebi que ultimamente as únicas coisas que eu tenho postado são minhas experiências "culinarísticas".

Não me acho uma chef de cuisine, não sei cozinhar... então por que cargas d'água mudei o blog?

Porque cozinhar pra mim é que nem fazer terapia para outros, eu reflito sobre a vida, ela é cheia de sabores, muitas vezes amargos... e nessas horas é bom colocar um pouco de açúcar em uma receita nova, distrair-se e refletir enquanto as coisas crescem no forno da minha cabeça dura.

Depois nome de blog não é que nem nome de criança, nasceu, batizou, não muda mais... mudar é amadurecer. (Apesar da cabeça dura às vezes eu mudo).

Agora vou correr porque esqueci minhas ideias no fogo e elas fugiram. Vou-me, antes que faça lambança.

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

Digestão

Quando o ontem é um tanto quanto atípico, difícil de digerir, nada como um sal de amigos para ajudar. Não borbulham, mas sempre sabem o que dizer e na hora certa, né Jana ;)

"Te desejo uma fé enorme, em qualquer coisa, não importa o quê, como aquela fé que a gente teve um dia, me deseja também uma coisa bem bonita, uma coisa qualquer maravilhosa, que me faça acreditar em tudo de novo, que nos faça acreditar em tudo outra vez”

Caio Fernando Abreu