segunda-feira, 2 de março de 2009

Joana e o menino

6h10. Toca o despertador. Joana leva a mão à tecla soneca e pensa, só mais cinco minutinhos. O mesmo processo se repete mais duas vezes.

Toca o despertador. Dessa vez, Joana olha a hora. Meu Deus, já são 6h25.Levanta de sobressalto e sai à caça do que vestir. Nunca havia escolhido a combinação tão rápido e parece ter ficado perfeito, até conseguiu incluir no traje um sapato que nunca antes tinha usado.

BIP! BIP! BIIIIIIIIPPP! O micro-ondas avisa que a água para o chá está pronta. Enfia dois saquinhos de mate com limão na xícara e sai engolindo. Amarra um lenço no pescoço, espirra o perfume de Rosas e Cassis, escova os dentes, pega os óculos de sol e sai.

Ponto do ônibus, 7h. Batuca os dedos na bolsa. Bate o pé. Olha no relógio e nada. Esse ônibus deve estar atrasado, pensa.

7h10. Nada. Definitivamente perdi o ônibus. A impaciência toma conta de Joana até que o ônibus dobra a esquina.

Sobe. Passa pela roleta. Vê que não tem nenhum banco sozinho disponível. Senta num de dois lugares, no corredor – o banco da janela permanece disponível.

Aos poucos surgem mais e mais pessoas. Joana repara que há muitos homens que estão em pé à sua volta e nenhum pediu licença para sentar. Examina o banco ao lado para ver se há algo de errado com ele. Nada. Eu devo ser muito assustadora. Homens, seres de pouca coragem, gostaria de saber o que tanto os constrange. Reflete Joana.

De repente, um pequeno ser surge ao seu lado e diz – Licença! Joana encolhe as pernas e deixa o menino passar. Ele senta ao seu lado. É uma graça, deve ter uns cinco ou seis anos. Olha do menino para os homens ao seu redor. Percebe como os homens são seres incompreensíveis e como nunca deveriam deixar de serem crianças – corajosas.

Observa. O menino se debruça na janela e fica olhando a paisagem urbana que vai ficando para trás.

Franze as sobrancelhas. Acaba de perceber que o menino tem pasta dental no canto da boca e fica pensativa.
Devo avisá-lo ou não? Não. Deve ser aí que começam os constrangimentos e a falta de reação dos homens diante das mulheres. Não são todas que causam esse efeito e não sei descrever as causadoras. Curioso! Muito curioso! Deveriam proibir as mães de lamber os próprios dedos e limpar as bocas dos filhos. Acho que encontrei o princípio da dependência masculina. Bom, nem todos os homens são assim, mas a maioria. Deplorável.

Duas mulheres param ao lado de Joana. O menino as dirige um sorriso. Finalmente um. Pensa Joana. Ele com certeza não se sentirá acuado. Espero... Que gracinha!

O ônibus chega ao terminal. O menino levanta e passa por ela, que continua sentada o observando. Em sua cabeça brota uma dúvida, mas aonde vai esse menino sozinho?

Descem do ônibus. O menino desaparece na multidão. Joana passa por ele enquanto desce as escadas que dão acesso ao túnel. Ela olha para trás e avista alguém que parece ser um irmão mais velho se aproximar do menino. Fica menos preocupada com a segurança dele. Que independente! Não é o tipo de criança que procura sentar próximo à asa protetora. Que bom, a humanidade precisa de homens assim e as mulheres principalmente. Ri de si própria. Estala os olhos e se lembra. Nossa, estou atrasada. Aperta o passo e segue seu caminho. No último lance de escadas já esqueceu do menino.